O ingresso no ensino superior no Brasil exige, via de regra, a conclusão do ensino médio. No entanto, situações excepcionais, como a aprovação em vestibulares por estudantes ainda cursando o último ano do ensino médio, têm gerado discussões jurídicas. Recentemente, o Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJGO), por meio do julgamento do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR) nº 5506253.98.2021.8.09.0000, trouxe um importante marco para a uniformização do entendimento sobre o tema. Este artigo analisa essa decisão e suas implicações para o ingresso antecipado no ensino superior.
IRDR do TJGO: Uma Decisão que Marca a Jurisprudência
O julgamento do IRDR nº 5506253.98.2021.8.09.0000, realizado em outubro de 2022 pelo TJGO, firmou a seguinte tese:
“É autorizado o ingresso de aluno em curso de graduação sem a conclusão definitiva do ensino médio, desde que cursando o terceiro ano deste último curso, devendo comprovar, ao final do ano letivo, a conclusão do ensino médio, sob pena de perda da matrícula e, consequentemente, do ano letivo cursado junto à Instituição de Ensino Superior.”
Essa decisão representa uma importante inovação no entendimento jurídico, ao permitir o ingresso no ensino superior antes da conclusão formal do ensino médio, desde que o estudante esteja cursando o último ano e que comprove sua conclusão ao final do período letivo.
Base Jurídica da Decisão
O TJGO fundamentou sua decisão nos seguintes princípios e dispositivos:
- Princípio da Isonomia: O julgamento do IRDR tem por objetivo garantir tratamento uniforme aos casos similares em todo o estado de Goiás, promovendo igualdade no acesso à Justiça e aos direitos educacionais.
- Finalidade do IRDR: Conforme o artigo 985 do Código de Processo Civil, o IRDR busca uniformizar o entendimento jurídico e promover segurança jurídica para os jurisdicionados.
- Direito à Educação: A decisão reforça o compromisso constitucional de assegurar o acesso à educação, previsto nos artigos 205 e 208 da Constituição Federal.
Implicações Práticas da Decisão
1. Flexibilização das Regras de Ingresso
A tese firmada no IRDR permite que estudantes aprovados no vestibular, mas ainda cursando o terceiro ano do ensino médio, possam antecipar seu ingresso na universidade, desde que cumpram o requisito de concluir o ensino médio ao final do ano letivo. Isso flexibiliza o acesso ao ensino superior, especialmente para alunos com desempenho acadêmico excepcional.
2. Condicionalidade e Responsabilidade
Apesar de autorizar o ingresso, o IRDR impõe a condição de comprovação da conclusão do ensino médio ao final do ano letivo. Caso o aluno não cumpra esse requisito, ele perderá a matrícula na universidade, bem como o ano letivo cursado. Essa medida visa garantir a integridade do sistema educacional e evitar prejuízos à formação do estudante.
3. Uniformização da Jurisprudência
Com a tese firmada, o entendimento passa a ser aplicado a todos os órgãos julgadores do TJGO, proporcionando maior segurança jurídica e evitando decisões divergentes. Isso beneficia tanto os estudantes quanto as instituições de ensino, que passam a contar com regras mais claras e previsíveis.
Evolução da Jurisprudência
A decisão do TJGO reflete uma tendência crescente de flexibilização no acesso ao ensino superior em situações específicas, valorizando o mérito acadêmico e considerando as circunstâncias individuais de cada caso. Outros tribunais brasileiros têm seguido caminhos semelhantes, ainda que as condições e exigências variem.
Enquanto o TJGO adota uma postura que exige a concomitância do ensino médio e da graduação, outros tribunais, como o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) e o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS), têm emitido decisões baseadas na aprovação no vestibular como critério suficiente para comprovar capacidade acadêmica, mesmo sem a exigência de conclusão concomitante do ensino médio.
Perspectivas Futuras
A decisão do IRDR no TJGO estabelece um importante precedente para o estado de Goiás e pode influenciar decisões em outros tribunais. Contudo, o tema ainda carece de maior uniformidade em nível nacional, o que demanda debates aprofundados e, possivelmente, regulamentação legislativa.
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) e o Supremo Tribunal Federal (STF) podem ter um papel relevante na consolidação de uma tese definitiva, especialmente se incidentes semelhantes forem levados à análise em âmbito nacional. Além disso, a regulamentação legislativa poderia criar critérios objetivos para evitar judicializações frequentes.
Conclusão
O julgamento do IRDR pelo TJGO marca um avanço importante na jurisprudência brasileira sobre o ingresso antecipado no ensino superior, ao permitir que estudantes cursando o terceiro ano do ensino médio ingressem na universidade, desde que comprovem a conclusão do ensino médio ao final do ano letivo. Essa flexibilização promove o acesso à educação e valoriza o mérito acadêmico, mas também reforça a necessidade de responsabilidade e planejamento por parte dos estudantes e das instituições de ensino.
A decisão reflete uma tendência de maior abertura para casos excepcionais, mas ainda há um longo caminho para consolidar um entendimento uniforme em âmbito nacional. O debate sobre o tema continua sendo essencial para garantir um sistema educacional que equilibre inclusão, flexibilidade e qualidade.